sábado, 13 de setembro de 2008

Pecado mortal, desgraça para a alma (I)

Sidney Silveira
Inferno, pecado mortal, salvação, juízo final, condenação, bem-aventurança e outras palavras, desgraçadamente, quase não são mais ouvidas nas Missas. Algumas delas parecem proscritas das homilias, e dão cada vez mais lugar a discursos sobre política, honestidade, solidariedade, ecologia, dia das mães, dia dos pais, entre outros assuntos de suma desimportância que não vale mencionar. Assim, os fiéis vão ficando doutrinalmente desorientados, e muitas vezes sequer têm idéia da licitude ou ilicitude de alguns de seus atos — isto sem falar que quase nunca são lembrados de que, de acordo com a doutrina bimilenar da Igreja, pode ir para o inferno mesmo uma pessoa piedosa, pagadora de suas dívidas, fiel ao cônjuge, amante da natureza, politicamente atuante em causas boas para o país, etc. Assim, a imensa maioria vai perdendo a noção da gravidade do pecado, e da urgência de dele nos afastarmos o quanto antes, se por desventura nossa caímos — e sempre por intermédio de uma boa Confissão e da freqüência aos Sacramentos.

Não é ocioso, portanto, destacarmos algumas dessas realidades, sempre de acordo com o parecer de teólogos, de Doutores da Igreja e do Magistério, seja solene ou ordinário. Comecemos pelo pecado mortal, seguindo de perto o Tratado de Teología Moral para Seglares, de Antonio Royo Marín, O.P.

O PECADO MORTAL

DEFINIÇÃO: O pecado mortal é a transgressão voluntária da lei de Deus em matéria grave.
Como diz o Angélico, essa monstruosa desordem espiritual faz do pecador réu da pena eterna. Portanto, o pecado mortal é o inferno em potência, pois um só desses pode levar-nos ao fogo eterno. O pecado mortal é, para Santo Tomás, o maior de todos os males possíveis, porque:

A) COM RELAÇÃO A DEUS, supõe uma gravíssima injustiça contra o Seu supremo domínio. Supõe também um desprezo pela amizade divina, a renovação da causa da morte de Nosso Senhor (como me disse certa vez um experimentado confessor, em cada pecado mortal é como se jogássemos no esgoto o sangue de Cristo) e uma violação do corpo do cristão como templo do Espírito Santo.
B) COM RELAÇÃO AO HOMEM, supõe um suicídio espiritual da alma, que por um só pecado mortal se vê imediatamente privada da Graça divina, fonte da vida sobrenatural. Atenção: POR UM SÓ ela perde os méritos naturais e sobrenaturais contraídos durante toda a sua vida, assim como o direito à Glória eterna. POR UM SÓ ela incorre em reato de pena eterna e na mais odiosa escravidão a Satanás (e aqui, poupo-me de citar exautivamente o Magistério infalível da Igreja, assim como Santo Tomás, quanto a este último ponto).

Condições que o pecado mortal requer

Para que haja pecado mortal, se requerem necessariamente três coisas: a) matéria grave; b) plena advertência por parte da inteligência; c) pleno consentimento por parte da vontade. Vejamo-las:

A MATÉRIA GRAVE
É evidente que nem todos os pecados são iguais. Existe desigualdade essencial entre o pecado mortal e o venial, e também nestas duas categorias de pecado há variados graus. A razão disto é que há distintos graus de desordem objetiva nas coisas más, e distintos graus de maldade subjetiva naquele que as comete.

O pecado mortal sempre requer matéria grave. Os critérios para conhecê-la são os seguintes:

A) A SAGRADA ESCRITURA. “Acaso não sabeis que os injustos não possuirão o Reino de Deus? Não vos enganeis: nem os impuros, nem os idólatras, nem os adúlteros, nem os efeminados, nem os devassos, nem os ladrões, nem os avarentos, nem os bêbados, nem os difamadores, nem os assaltantes possuirão o Reino de Deus”. (Cor. VI, 9-10). Há incontáveis outros textos da Sagrada Escritura que nos orientam sobre a matéria dos pecados mortais, que nos privam do céu.
B) O MAGISTÉRIO DA IGREJA, que determina acerca da licitude ou ilicitude de uma ação, assim como os graus de pecados e o perdão a eles concedido. O fundamento, aqui, é também escriturístico: “Tudo o que ligardes na terra será ligado no céu; tudo o que desligardes na terra será desligado no céu”. (Mt. XVIII, 18).
C) A RAZÃO TEOLÓGICA. Esta pode ponderar o que se requer para que uma ação envolva grave desordem em relação a Deus, ou em relação ao próximo ou em relação a nós mesmos. A sentença comum dos maiores doutores e teólogos da Igreja em todos os tempos tem tal peso, que ninguém pode afastar-se dela sem manifesta temeridade.

Em geral, se consideram pecados mortais: a) os que vão diretamente contra Deus ou contra alguma de Suas perfeições (idolatria, desespero, blasfêmia, sacrilégio, etc.; b) os que prejudicam gravemente o próximo, em sua saúde, em sua vida, em sua fortuna ou em sua honra (assassinato, roubo, detração, calúnia, fraude, etc.); c) os que supõem uma desordem contra o próprio pecador, porque subvertem a natureza e o fim buscado por esta (auto-mutilação, masturbação, onanismo, adultério, etc.).

Continuaremos, num próximo post, com a tipificação do pecado mortal, utilíssima como orientação para os fiéis. E façamos uma importantíssima advertência: se alguém (provavelmente um liberal, ainda que enrustido) disser que as classificações da teologia moral são um excesso, e que bastam os 10 mandamentos para orientar-nos em nossa dificílima caminhada rumo ao céu, tenha certeza do seguinte: esta pessoa é não apenas uma péssima influência, mas é alguém que vai induzi-lo a toda sorte de pecados.
(prossegue)