A partir do princípio metafísico estabelecido anteriormente — de que nenhum ente pode ser causado pelo seu próprio operar —, ficou assentado que não são as escolhas o que nos faz ser livres, mas uma instância ontologicamente superior a cada ato de eleger esta ou aquela coisa: a vontade, apetite intelectivo do bem.
Se, por uma radical impossibilidade metafísica, a liberdade não está fundada nas escolhas livres (que são uma operação sua, tão-somente), muito menos pode estar fundada na consciência individual. Santo Tomás, no De Veritate, questão De Conscientia, explica que o nome “consciência” significa a aplicação de uma ciência a algo, daí ser uma espécie de “com-saber” ou “saber simultâneo” (simul scire). E, justo por ser a aplicação de uma determinada ciência a algo, a consciência não pode significar, em termos metafísicos, um hábito ou potência, mas um ato — e, aqui, lembremos que a liberdade é um conceito afim ao de potência, pois é sempre liberdade de ou para.
Quando a ciência se aplica a algo com o intuito de dirigir, diz Santo Tomás que a consciência instiga, induz ou obriga; quando se aplica a algo para examinar o que se fez, diz-se que a consciência acusa ou remorde (accusare vel remordere). Ademais, a consciência pode errar, e, como veremos em textos mais à frente, liberdade e erro se auto-excluem radicalmente; daí que a liberdade não possa estar sediada na consciência individual (passível de erro), ainda que esta última tome uma parte em todos os atos propriamente humanos. Daí também que um sujeito tenha o direito de errar, mas o seu erro não possa ter quaisquer direitos, pois dar direitos políticos ao erro implica atrofiar, com o passar do tempo, a liberdade dos indivíduos (a verdadeira, que radica na vontade e tem como objeto algo exterior a ela, como se explica no último parágrafo), ainda que sob pretexto de defender a "liberdade" de escolha. Se alguém, por exemplo, receita um veneno letal de ação rápida para curar uma pequena ferida no dedo mindinho do pé, esse erro deve ser refutado publicamente, em prol de todos. E, dado esse caráter comunitário da verdade, ou seja, de estar a serviço do bem comum e não de interesses conflitantes com este, dizia com propriedade Santo Agostinho: “A verdade não é minha nem tua, para que seja nossa”.
Outro ponto destacado por Santo Tomás nesse texto luminoso no De Veritate é a distinção formal entre consciência e livre-arbítrio. Os juízos da consciência e do livre-arbítrio diferem porque o juízo da consciência se mantém no plano do conhecimento, enquanto o do livre-arbítrio implica conhecimento e afeto, na medida em que é um juízo de escolha (iudicium electionis). Ademais, assim como acontece com a consciência, o livre-arbítrio (que não é a liberdade, mas a capacidade de escolha) pode errar ou se perverter, pelo influxo das paixões.
Não tendo, pois, como fundamento nem os atos livres nem a consciência — e embora resida essencialmente na vontade —, a liberdade pressupõe, com relação ao seu objeto, algo extrínseco à vontade e também à inteligência: quanto aos meios, esse algo é um ente apetecível e inteligível; e quanto ao fim, necessariamente, como veremos noutra ocasião, é o Próprio Ser Subsistente. Diga-se, portanto, que reduzir a liberdade humana à chamada “liberdade de consciência”, ou à “liberdade de pensamento/expressão” ou ainda à "liberdade de escolha" foi obra do liberalismo, ou melhor: foi obra parida no protoliberalismo anticlericalista, inimigo da Igreja, e continuada em correntes e disfarces os mais diversos, nos últimos 200 anos.