Sidney Silveira
A VOLÚPIA por manifestar publicamente uma presumível opinião pessoal, que no entanto não é opinião, por carência da ponderação devida, nem pessoal "stricto sensu", porque lhe falta a profundidade sem a qual nenhuma personalidade pode firmar-se sobre raízes sólidas, é a faceta contemporânea da boa e velha vanglória, tornada patologia coletiva.
A voragem moral de opinar inviabiliza a opinião. Faz a pessoa chegada a este dramático ponto adorar os palpites mais ou menos sofisticados, mais ou menos infelizes que perpetra — sempre perante alguma platéia. Tal vício é hoje estimulado pela doce ilusão de que a facilidade de comunicar um palpite nas redes sociais pode, magicamente, dotá-lo do mais ínfimo estatuto de verdade.
Triste sina a dos palpiteiros indomesticáveis cujo mundo interior se fossiliza, a ponto de não lhes deixar outra opção senão adornar forçosamente os próprios talentos e odiar — por uma espécie de instinto maligno — o que com culpa mais ou menos grave se recusam a entender.
"Não sei, não quero saber e tenho raiva de quem sabe". Na Idade Média este lamentável sestro era pecado capital, e seu nome, acídia.
O opiniático pelo menos tem a seu favor o buscar evidências em que se apoiar; o palpiteiro forja as evidências com maior ou menor grau de consciência do delito cometido contra a própria inteligência.
Em suma, o prudente ao opinar tende à verdade; o imprudente ao fazê-lo tende às mentiras neuróticas, e esta tendência geralmente se atualiza por meio dos palpites envernizados em que a psique naufraga.
Uma pessoa chegada a este ponto odeia amar o que não é espelho. E não desconfia que, como dizia um provérbio medieval, vasos vazios ressoam muito: "Vasa inania multum strepunt".
Mas o pior de tudo é quando esse estrépito dos tolos se imiscui nas coisas filosóficas. É este o famigerado sinal de que a pessoa está a meio caminho do que a Igreja sempre chamou de pecado contra o Espírito Santo.