terça-feira, 19 de maio de 2015

O encosto facebookiano


Sidney Silveira

Onde reina a dissipação mental, asnos pontificam — não raro com ar afetado de circunspecção, indigerível para qualquer pessoa com dois dedos de miolos e um pouco de bom senso. Assim é o Facebook: com volúpia opiniática imparável, verdadeiras cavalgaduras desembestam certezas sobre os mais variados assuntos, com o entusiasmo insano de quem atirasse blocos de granito à cabeça de inimigos imaginários. Não conseguem apresentar os seus argumentos sem denegrir outras pessoas, e aqui se vê a nota distintiva do caráter desses indivíduos audazes: se ninguém os lisonjeia, eles próprios encarregam-se de fazê-lo, sem qualquer sinal detectável de pudor.

Por trás do teclado dos computadores de onde reinventam a roda e o mundo, são Hércules invencíveis; pessoalmente, costumam ser libélulas a esvoaçar tímidas em torno do próprio ego. De longe, atroam; de perto, esganiçam. Começam por fazer alusões maldosas em postagens enigmáticas, depois passam à detração enviesada, até que, flagrados em delito de inveja ou de ódio, são impelidos a mostrar o estado tétrico de suas almas.

Quando porém se trata de julgar moralmente as atitudes alheias, sob a proteção reconfortante proporcionada pelo evanescente universo virtual, essas libélulas tornam-se carniceiras, agem como urubus esfomeados. Julgam-se no direito de cobrar condutas de pessoas cujas motivações nem de longe vislumbram. Trombeteiam juízos definitivos que, de alguma maneira, mancham a honra alheia, o que pouco se lhes dá; a reputação do próximo é um conceito abstrato inalcançável para quem chafurdar transformou-se em ofício.

O Facebook é hoje a tribuna das susceptibilidades eriçadas, dos ataques enraivecidos, do desnudamento involuntário de vaidades letais, do entretenimento de sádicos e psicóticos, da incivilidade ostentada como coragem.

Quem nele entra para ver e fazer coisas boas, aprenda a ser seletivo e tenha cuidado: a péssima companhia virtual tem o condão de se fazer virtualmente onipresente. 

Em tais casos, não tem pé-de-pato-mangalô-três-vezes que dê jeito. 

Só Deus pode afastar o encosto!