segunda-feira, 21 de junho de 2010

Sobre maus conselhos e avestruzes modernistas

A oitava vala de Malebolge: maus conselheiros envoltos em chamas.
Ilustração de Sandro Botticelli

Sidney Silveira
Ensina João de S. Tomás no seu Cursus Theologicus (II, q. 22), com aquela clareza que tanto apreciamos, que o nome “verdade” exclui os conceitos de tudo o que é simulado ou vazio, pois o verdadeiro está fundado e firmado no real (fundatum et firmum in re). Com isto nos indica, como bom tomista, que a verdade diz respeito fundamentalmente à realidade das coisas, dado ser uma relação categorial-formal e, ao mesmo tempo, transcendental:


a) categorial-formal porque estabelecida por nossa inteligência, que apreende imaterialmente as formas das coisas e as classifica; e
b) transcendental porque se baseia no ente real extra mentis. A propósito, como se disse neste vídeo, as coisas não são porque “Eu penso”, pois o Cogito precisa de um cogitatum, mas “Eu penso” porque elas são. Descartes e, depois dele, Kant, cabularam essa aula metafísico-gnosiológica.

Em resumo, o ser é o princípio gnosiológico inamovível. Retire-se o ser do horizonte e nada poderá ser pensado, imaginado, categorizado pelo homem. Por isso pode-se muito bem dizer que todas as patologias da alma humana provêm, radicalmente, de um afastamento do real — nessa complexa relação da inteligência com as coisas. Portanto, sem a verdade que se funda no ente e se formaliza na inteligência não nos resta senão cair num precipício intelectual e, deste, na cegueira moral, pois como pode agir bem quem não apreende minimamente a verdade das coisas?

Lembrei-me disso a propósito de mais um email recebido de um modernista católico que padece de um sestro terrível, como sói acontecer com pessoas que voluntariamente não querem analisar um problema em toda a sua amplitude (no caso, o da crise da Igreja): multiplicar as questões antes de responder às objeções. Essa mal-disfarçada tática indica uma tremenda patologia, o não querer ver a realidade das coisas, pecado este que, antigamente, tinha o nome de acídia — a ojeriza à própria excelência, muitas vezes fomentada por uma radical covardia.

Além de tal atitude representar uma burrice sem tamanho, pergunto-me: até que ponto realmente um sujeito desses não enxerga a sua mal-disfarçada tática, o estratagema primário de adiar uma conclusão que se impõe como evidência absoluta, a saber, que os frutos do Concílio Vaticano II e do Magistério posterior a ele são terríveis e causadores diretos da imensa crise atual? Assim, a essa pessoa e aos outros seus colegas que certamente me lêem (pois os modernistas neoconservadores estão entre os maiores consulentes dos textos do blog), vai um recado: por favor, não mandem novos emails, pois não me darei o trabalho de respondê-los, a menos que vocês esbocem um argumento contra os apresentados em minha contestação. Alguns inclusive já estão devidamente bloqueados de minha caixa de mensagens. Não tenho mais a mínima vontade de dialogar com vocês; a propósito, esta foi uma das razões por que não abrimos o Contra Impugnantes para comentários.

O pior é que tais avestruzes nem tiraram as fraldas e, mesmo com tamanha dissimulação e covardia, querem meter-se em discussões filosóficas e teológicas sem cujo conhecimento aprofundado (que eles não possuem) jamais poderiam dar sequer um pitaco sobre o Magistério da Igreja. Como atenuante para essa atitude de não querer ver o óbvio, engendrando mil questiúnculas para fugir às conclusões que os assustam, está a ignorância — ainda que culpável.

Por isso, o único conselho que vale para eles é: estudem, antes de se meter onde não têm competência, para não se transformarem em maus conselheiros em matéria tão grave. Lembrem-se de que, como diz o escolástico renascentista João de S. Tomás, a verdade é fundada e firmada no real. Se querem fugir dele, por favor não contem com a minha modesta ajuda... Reitero: pelo amor da Virgem, não me escrevam mais.