sábado, 2 de maio de 2009

Pequeno achado

Sidney Silveira
No excelente site Stat Veritas — que presta um inestimável serviço, com a difusão de textos do Magistério, de teólogos, de Doutores, além orações e textos sobre a Sagrada Liturgia, etc. —, encontrei por estes dias o texto “O pecado típico do liberalismo”, de Julián Gil de Sagredo. Um escrito curto, sintético, mas que faz uma argutíssima observação sobre os tipos de autonomia que diferentes tipos de liberalismo* propugnam:

1- No liberalismo teológico de Lutero, a razão se desvincula da Fé e cria o livre exame (erigido como novo árbitro da Verdade revelada).
2- No liberalismo filosófico de Descartes e de seus epígonos Kant, Fitche, Schelling e Hegel, a razão se desvincula da realidade e fabrica os vários tipos de idealismos (todos letalmente daninhos).
3- No liberalismo jurídico de Hobbes, a razão se desvincula do direito natural e acaba por promover o positivismo jurídico.
4- No liberalismo político-social de Rousseau, a razão se desvincula da natureza social do homem e inventa o pacto social.
5- No liberalismo econômico de Stuart Mill e de seus prosélitos, a razão se desvincula da hierarquia dos valores e transforma a economia (que é meio) em um fim em si mesma. Ou, na melhor das hipóteses, num meio não necessariamente vinculado ao fim (o que dá na mesma).

Esses liberalismos, de acordo com o articulista, foram destruindo, uma a uma, algumas das grandes sínteses que a Cristandade havia construído:

a) a síntese entre a vontade e a Graça, que resolvia o problema da predestinação;
b) a síntese entre o entendimento e a vontade, através da idéia que resolvia o problema da verdade;
c) a síntese entre o direito humano e o direito natural, que resolvia o valor da lei positiva;
d) a síntese entre autoridade e liberdade, que dava ao Estado (e aos indivíduos) o seu medium, o seu ponto de equilíbrio;
e) a síntese entre indivíduo e comunidade, que moldava a forma mesma da sociedade.
No decorrer do tempo, em meados do século XIX, surgiu o mais nefasto dos liberalismos — o católico (esse, do tipo de Lord Acton). Dada a sua sutileza, dada a sua engenhosa tentativa de conciliação entre contrários e contraditórios, o liberalismo católico pretende o acordo entre Cristo e Belial: um pacto entre o sistema liberal, que proclama a autonomia da razão individual e, por conseguinte, o esfacelamento do corpo social em células cada vez mais estanques, independentes e sem norte, desprovidas de uma ratio unitiva (no caso, a Fé), e o sistema católico, que sempre propugnou a heteronímia ou sujeição de ambos (indivíduo e Estado) a Deus.

Por este pequeno grande achado, o texto de Julián Gil de Sagredo vale a leitura.
* Com o termo “liberalismo”, não me refiro neste texto ao liberalismo histórico que se desenvolve na virada dos séculos XVIII para o XIX, mas a um conjunto de teoremas que embutem a visão de mundo liberal, baseada na autonomia da razão e da vontade, sob os mais variados disfarces.